Os 4 tempos da experiência de leitura
Você escolhe um bom lugar, de repente pega uma bebida, senta confortavelmente e começa a passar o olho pelas páginas. Isso resume bem a sua experiência de leitura de um livro, certo? Provavelmente não, a coisa é um pouco mais compicada do que parece.
Uma experiência de leitura diz respeito a tudo o que você pensa, sente, imagina, acredita sobre um livro, um autor ou uma editora, então ela começa bem antes de você pegar o livro na mão, ou mesmo ver ele em uma livraria. Em geral podemos dizer que a experiência de leitura tem quatro tempos, a experiência antecipada, a experiência momentânea, as experiência episódicas e a experiência cumulativa.
Experiência antecipada
A experiência antecipada acontece nos primeiros contatos com o livro, mas são os primeiros MESMO. Quando algum amigo comenta sobre o livro com a gente, quando vemos uma postagem sobre ele nas mídias sociais, quando numa passada de olho vemos ele em uma estante na livraria, ou nas recomendações dos sistemas de avaliação de livros.
Nesses momentos já estamos criando expectativas sobre o livro, sejam positivas ou negativas, e isso vai definir o tipo de experiência que eu vou ter quando, e se for lê-lo.
Imagine por exemplo que um amigo disse que leu um livro maravilhoso, contando vários os detalhes sobre ele e sobre a história. Nesse exato momento já começou a surgir na sua mente uma imagem desse livro, provavelmente positiva porque esse amigo disse que o livro era bom. Em seguida esse mesmo livro aparece para você no Skoob, você entra no link e nota que ele tem boas avaliações e comentários. Finalmente o livro começa a aparecer para você mais vezes, porque o autor ou a editora apostaram no remarketing, aquele estratégia que faz com que um mesmo produto apareça repetidamente para você nas mídias sociais depois que você visita a página dele. Finalmente você vê que o preço não é ruim e compra o livro.
Tudo o que aconteceu até você ter o livro em mãos define a forma como você vê ele, e essa expectativa pode ser frustrada, se o livro não for tão bom assim, ou superada, se ele for melhor que essa imagem criada por esses contatos indiretos.
Experiência momentânea
A próxima experiência é a experiência momentânea, é o primeiro contato com o livro, daí entra o cuidado com a apresentação da história, o trabalho gráfico, as cores, as fontes, as ilustrações, a capa (se bem que essa também entra na experiência antecipada). É aquela história, a primeira impressão é a que fica, então esse primeiro contato é uma chance de encantar literalmente o leitor, que depois pode levar essa impressão para as outras páginas e outras leituras.
Experiência episódica
Depois dessa primeira impressão outras tantas vão acontecer, seja pela leitura de outros capítulos ou pela retomada do livro depois de deixar ele parado por um tempo, cada uma dessas sessões de leitura é chamada de experiência epísódica, um episódio de leitura, onde serão reafirmadas as expectativas criadas na leitura antecipada ou na primeira leitura (a leitura momentânea).
Experiência acumulada
Por último, mas não menos importante está a experiência acumulada, que é a soma de tudo, desde os primeiros contatos da experiência antecipada, a primeira impressão da leitura momentânea, cada um dos episódios de leitura e também tudo o que acontece depois de lida a última página. É o acumulado de tudo, trazendo uma carga de emoções, ideias, sentimentos, e tudo o mais que envolve a literatura e a arte do livro.
Uma das coisas mais interessantes da experiência acumulada é que ela pode mudar. Por exemplo, quando um autor tem um posicionamento polêmico, a carga emocional da polêmica pode contaminar mesmo que parcialmente a experiência que as pessoas tiveram com seus livros, mesmo os mais aclamados e que trazem as experiência mais inesquecíveis. É só lembrar do caso dos comentários da escritora J. K. Rowling que foram considerados por muitas pessoas como transfóbicos e geraram todo tipo de reação.
É possível que leitores da saga Harry Potter tenham tido a sua experiência com o livro modificada, mesmo não tendo nada a ver com o texto ou o livro propriamente dito.
Outra possibilidade da experiência cumulativa é a nossa própria carga cultural como leitores. Não sei se vocês já tiveram a possibilidade de reler um livro depois de muitos anos. É possível que um livro que nós achamos maravilhoso em um primeiro momento ao ser relido seja visto como bobo. E o contrário também pode acontecer, reler um clássico e então ver uma miríade de detalhes que passaram batidos da primeira vez, criando uma nova e renovada experiência.
Conclusão
Isso tudo mostra o extremo cuidado que autores, editores e todos os profissionais do ecossistema do livro devem ter com cada detalhe. Mesmo aqueles que estão da capa para fora. E isso se torna ainda mais grave quando o autor publica um livro sozinho, porque daí ele vai ter que tratar de todas essas experiências por conta própria, o que é bem mais desafiador de fazer do que contar com a extrutura de uma editora por exemplo.
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