A experiência de leitura de revistas

Por Davi Denardi
em

A experiência de leitura diz respeito a toas as percepções e respostas dos leitores em relação à leitura de um produto literário, entre eles, as revistas. Ela inclui todas as emoções, crenças, preferências, percepções, respostas físicas e psicológicas, comportamentos e realizações dos leitores que ocorrem antes, durante e após a leitura (conceito adaptado da ideia de experiência do usuário – ABNT 9241-11).

Como você pode ver o conceito é bem amplo e envolve questões relacionadas ao conteúdo, aos aspectos gráficos, a gestão da marca da publicação, o contexto histórico ou social onde ela é publicada, entre outros elementos.

O que é uma revista

Uma revista é uma publicação periódica informativa, jornalística ou de entretenimento (Wikipedia) cuja principal característica é o caráter de revisão (acréscimo nosso).

Assim, em primeiro lugar uma revista é um produto periódico, se não for assim ela é um relatório, livro ou boletim. Já em relação ao seu conteúdo ela pode ter vários direcionamentos, como uma revista de cunho político, financeiro, de moda, automotiva, esportiva, entre outros.

Em terceiro lugar uma revista é uma revisão de um assunto. A palavra em português tem relação com o ato de revistar, de examinar detidamente alguém ou algo (Dicionário Oxford). Nesse sentido podemos falar de ao menos de dois grandes extremos, o jornal, que é uma publicação diária, e a revista, cuja periodicidade é maior (semanal, quinzenal, mensal, semestral, entre outros).

Nesse sentido o jornal traz as informações de forma rápida e imediata, e a revista faz a revisão dessas informações com mais detalhes e com mais cuidado. Isso porque ao noticiar imediatamente um fato alguns contextos e desdobramentos podem não ser percebidos imediatamente.

O conteúdo de uma revista

O conteúdo de uma revista é geralmente mais elaborado, justamente porque se distrancia no tempo em relação aos fatos. Por exemplo, uma matéria sobre um evento de moda que acabou de acontecer provavelmente vai relatar como ele aconteceu, trazendo várias fotos de cada desfile, mas sem necessariamente pensar sobre os efeitos deste. Já uma revista de moda pode discutir os efeitos desse evento, escolhendo os melhores desfiles, discutindo melhor o conceito do evento e os desdobramentos dele ao longo de um certo período de tempo.

Por isso, de forma geral existem mais erros sendo cometidos nos jornais (talvez pelo curto período de tempo em que os conteúdos devem ser produzidos) do que em uma revista, cujos conteúdos podem ser produzidos com mais calma.

Além disso o conteúdo deve estar sempre sendo alinhado com as percepções do público da publicação, temas que são mais caros aos leitores ao longo do tempo ganham mais espaço, e temas menos interessantes podem perder lugar ao longo da vida de uma publicação.

O visual de uma revista

O apelo visual é uma das características mais importantes de uma revista (na imagem projeto gráfico de Beatriz Delmiro)

Da mesma forma que o conteúdo, em geral os aspectos gráficos de uma revista são mais refinados do que um jornal. Nesse tipo de publicação existe mais tempo para a produção ou escolhas das imagens, a produção de elementos adicionais como boxes, gráficos, infográficos, ou mesmo para a diagramação geral da publicação.

Por isso, a expectativa dos leitores em relação à capa e o visual geral de uma revista é maior do que um jornal, por exemplo. Além disso, um projeto gráfico alinhado com a missão da revista e com as expectativas dos leitores é fundamental para uma boa experiência de leitura.

A gestão da marca de uma revista

A gestão de marca é uma atividade complexa e leva em consideração elementos internos à publicação, como missão editorial, perfil da equipe, recursos disponíveis, estratégias de marketing, capacidade de alcance e distribuição, entre outros; e aspectos externos, como distribuição geográfica, perfil de público, concorrência, referenciais, entre outros.

Além disso, por ser um produto periódico uma revista deve manter uma certa consistência em relação ao tipo de conteúdo que se propõe a produzir. Ou seja, uma revista que já tenha dois anos tratando de esportes vai ter mais dificuldade em se transformar em uma revista de moda.

Por isso, uma das bases fundamentais de uma boa experiência de leitura e da gestão de uma marca de revista é ter um projeto editorial assertivo, e ter consistência desse projeto ao longo do tempo.

Eu uso a palavra “consistência” porque modificações vão sempre existir dentro de qualquer empresa ou publicação, mas um certo “fio condutor” precisa existir para que o relacionamento com o público seja fortalecido.

O contexto histórico-social e a experiência de leitura

Como a experiência de leitura envolve toda a subjetividade das pessoas ela sofre muito o efeito das mudanças históricas e sociais ao longo da sua vida. Um exemplo, não relacionado ao conteúdo propriamente dito são os anúncios de cerveja, que durante muito tempo tinham uma direção de sexualização da mulher, e era considerado normal. Mas ao longo do tempo, com as discussões a respeito desse tipo de anúncio, e da entrada das mulheres como consumidoras desse tipo de produto, os anúncios mudaram.

Polêmica na capa da revista Elle. (reprodução El Pais)

Nesse sentido foi criada uma polêmica em relação à capa da revista Elle Australiana, em uma das capas a modelo está amamentando o filho, em outra está com o filho no colo com um vestido preto. Dependendo do contexto histórico-social dos leitores (pró-amamentação em público ou contra) a experiência com a primeira capa será diferente.

O mesmo está acontecendo atualmente em relação à narração feminina no futebol, um espaço historicamente ocupado pelos homens e que agora tem novas nuances com as mulheres narrando. Ou seja, o tipo de conteúdo apresentado aos telespectadores está sendo modificado em função de uma demanda social, a saber, a inclusão das mulheres no universo do futebol.

Esse tipo de movimento sempre vai acontecer, e cabe aos gestores e produtores de conteúdos de revistas responderem conforme a missão editorial ou o posicionamento das marcas e publicações, e ao fazer qualquer mudança a experiência de leitura vai mudar. Ainda em relação à narração feminina, pessoas mais propensas a inclusão das mulheres no universo do futebol vão consumir e gostar da narração feminina, impactando a experiência de leitura; já outros grupos de leitores vão se desagradar com a mudança e ter uma experiência negativa.

Concluindo

A experiência de leitura depende de diversos fatores, por isso, cada um deles deve ser tratado com cuidado. Além disso, cada revista tem características diferentes e por isso mesmo vai propor experiências distintas para os leitores, para algumas o visual é essencial, como as revistas de moda; para outras um conteúdo técnico e aprofundado é a base da experiência, como em revistas de engenharia, por exemplo; em outras o contexto histórico-social é o foco principal, como as revistas de cunho político ou revistas engajadas.

Assim, conhecer a verdadeira experiência de uma revista depende de muito estudo e experiência prática dos editores, gestores e profissionais ligados ao conteúdo.

Como pode ser visto, essa postagem não cobre todos os aspectos de uma experiência de leitura e por isso mesmo estará sempre em revisão para acrecentar novas nuances. Por isso, se você quiser fazer qualquer contribuição ou pergunta pode usar os comentários dessa postagem ou nos mandar uma mensagem por e-mail ou pelas nossas redes sociais.

           
sobre o autor Davi Denardi Davi Denardi é pesquisador de design editorial e game design, e professor dos cursos de Design Gráfico, Design Digital e Design de Jogos da Universidade Federal de Pelotas.

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