Por que os livros em papel são melhores de ler?

Por Davi Denardi
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A presença física é um dos elementos mais recorrentes quando se fala na experiência de leitura. A questão do cheiro dos livros, da textura do papel, do seu peso, formato e mesmo da sua própria presença física em bibliotecas ou estantes têm efeito na experiência de leitura.

Em um estudo da pesquisadora Thumala Olave, realizado por meio de 64 entrevistas com amantes de livros no Reino Unido, foram identificadas uma gama de relacionamentos associados à presença física dos livros, seja em estantes e bibliotecas, ou no ato de leitura. No estudo, os livros têm uma função estética, simbólica e emocional, eles fazem parte da decoração dos ambientes, mas também representam um certo status social, trazem consigo uma certa intelectualidade, como se os leitores de uma forma geral fizessem parte de um grupo diferenciado. Em uma das entrevistadas do estudo uma leitora afirma que:

“Para mim ter um livro é maravilhoso, adoro estar perto de livros. Se estou em uma biblioteca, entrar lá é simplesmente maravilhoso por estar cercado por tantos livros. É apenas um sentimento bom de ter tanta sabedoria ao redor você”.

Então é importante lembrar que mais que palavras, um livro é um objeto físico, e que uma parte da relação que temos com eles tem a ver com a sua forma, seu peso, o tipo de papel usado, os acabamentos da capa, entre outros elementos físicos do livro.

A aparência do livro físico também possui uma carga de significados: um dos entrevistados de Thumala Olave diz que “Eu gosto bastante de livros baratos, especialmente se eles parecem que foram bem lidos, só porque eu acho que é um pouco como gosto de livros em si, porque é uma pequena conexão com outra pessoa, esse tipo de coisa”. Nesse caso, o fato de o livro parecer estar “gasto” é um fator relevante para a experiência de leitura porque sugere uma conexão, mesmo que simbólica, com outro leitor.

Essa presença física é tão importante que os e-readers, produtos digitais que servem como suporte para e-books, como o Kindle da Amazon ou o Kobo, têm as mesmas dimensões de um livro tradicional, reforçando a relação com o aspecto físico dos livros.

Livro físico versus livro eletrônico

Em outro estudo de Baron, Calixte e Havewala feito com 429 estudantes em cinco países, foram levantadas as preferências dos participantes comparando-se os livros impressos com os livros digitais. No estudo, cerca de dois terços dos entrevistados afirmaram preferir os livros impressos e entre as respostas 4,0% não ficaram satisfeitos com a forma como interagiram com uma página de texto digital em função da sua presença física, comentando, por exemplo, que “Falta a qualidade tátil do livro”, “O digital é superficial” e “A mídia impressa me dá um sentimento de propriedade… você não coloca a mídia digital em sua estante”.

Os elementos físicos do livro influenciam a leitura

Ainda em outro estudo de Hou, Rashid e Lee defendem que não existe uma área específica do cérebro dedicada à leitura, sendo ela uma habilidade muito recente dentro da fisiologia humana. Assim, são utilizadas outras áreas do cérebro durante o ato de leitura; uma delas é a área responsável pelo reconhecimento de objetos e outra é o reconhecimento de paisagens.

Então, durante o ato de leitura o livro e o texto são processados como objetos físicos, juntamente com o entorno onde ocorre o processo de leitura, então a memorização e o processamento da leitura de um livro incluem essas informações.

Os pesquisadores discutem que o livro digital poderia trazer em si deficiências relacionadas ao processo de leitura, visto que o livro digital tem uma fisicalidade própria e a leitura costuma acontecer em um ambiente controlado, a tela do computador ou do e-reader.

Os pesquisadores discutem duas teorias que explicam essa deficiência: a teoria do mapa cognitivo e a teoria da materialidade do meio. Na teoria do mapa cognitivo as deficiências identificadas na leitura dos livros eletrônicos seriam fruto de uma falta de elementos que auxiliem o leitor a se localizar internamente dentro do texto durante o processo de leitura. Na leitura de um livro tradicional, por exemplo, o leitor reconhece que um determinado trecho está no começo ou no fim do livro em função do acúmulo de folhas de um lado ou de outro; em um livro digital essa referência deixa de existir, o mesmo acontecendo para o ambiente onde a leitura aconteceu, quando um determinado trecho pode ser lembrado por ter sido lido sentado ao sofá por exemplo.

Já a teoria da materialidade do meio sugere que o processo de leitura é influenciado pelo efeito multissensorial dados pela materialidade do livro. Nessa teoria a lembrança da leitura é efeito do toque das mãos no livro e no papel, bem como os cheiros, sons e outros aspectos sensoriais envolvidos na leitura.

Porém, o resultado do estudo, que buscava identificar qual das duas teorias têm mais efeito no processo de leitura, mostra claramente que a teoria do mapa cognitivo é mais relevante no processo de leitura.

Os efeitos da presença física do livro na arquitetura e na sociedade

O livro é um produto tão importante na nossa cultura que ele modifica inclusive a arquitetura de nossas casas e cidades.

A simples existência de uma biblioteca mostra a sua importância social, ou seja, foi criado um prédio, um órgão e uma área de estudo específica (a bibliotecnomia) para lidar com ele.

Já dentro das nossas casas foram criados espaços específicos para eles, como as bibliotecas particulares, as estantes e mesmo produtos menores como os suportes para livros. Isso mostra um certo carinho e um tipo de devoção em relação a eles. O que você sente por exemplo quando precisa emprestar um livro? Para algumas pessoas é algo bem dolorido e outras nem mesmo cogitam emprestar seus livros.

Conclusão

Existem diversos elementos que envolvem a experiência de leitura e que precisam ser estudadas e conhecidas por designers, editores e autores que queiram fazer com que seus livros sejam mais efetivos na entrega de uma experiência positiva.

Aqui foram apresentados apenas alguns estudos relevantes nesse sentido, e como este é uma publicação digital ela vai ser atualizada de tempos em tempos com novos estudos. E se você quiser conhecer novos textos e estudos ligados ao universo dos livros assina a newsletter que avisamos sempre que novos conteúdos forem publicados.

           
sobre o autor Davi Denardi Davi Denardi é pesquisador de design editorial e game design, e professor dos cursos de Design Gráfico, Design Digital e Design de Jogos da Universidade Federal de Pelotas.

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