Os quatro tipos de UX ao longo do tempo

Por Davi Denardi
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A experiência do usuário (UX) é um tema complexo que varia entre características pessoais e sociais, mas além disso ela se extende ao longo do tempo e pode acontecer antes, durante e depois de usar um produto, o que requer do designer uma atenção especial a todos os detalhes.

A experiência antecipada

Uma experiência antecipada é aquela que acontece mesmo antes de usarmos um produto ou serviço. E isso acontece justamente pela expectativa que criamos em relação a esse contato.

Mas não se trata apenas de criar uma expectativa, mas dar a ela uma direção e uma intensidade. Isso se dá por diversos meios, como uma conversa informal com amigos sobre um produto ou serviço, postagens em redes sociais relacionadas a elas (principalmente as orgânicas), anúncios, ações de marca e todo o tipo de contato que envolva você (usuário/cliente) e uma marca, produto ou serviço.

Por exemplo, um filme de Hollywood geralmente custa US$ 100 milhões, sendo US$ 65 milhões de produção e US$ 35 milhões de publicidade. Sim, pouco mais de um terço do custo de um filme fica para a promoção dele, trailers, anúncios, eventos, etc. Isso porque para sair de casa e ir ao cinema nós precisamos de um motivo, uma vontade, uma expectativa, e isso é criado ao nosso redor, não é natural e nem orgânico.

A vontade de ir ver um determinado filme no cinema é um exemplo de experiência antecipada

Quando dá certo o filme supera a expectativa e daí começa a funcionar o boca a boca, as indicações informais e o filme ganha vida própria. O oposto acontece quando a expectativa criada pelas promoções do filme são maiores que o filme em si, e daí temos os fiascos de bilheteria.

Os filmes aqui são só um exemplo, todo produto mercadológico passa por esse tipo de criação de expectativas e desejos. Celulares, aplicativos, carros, motos, serviços, e todo o tipo de produto colocado à diposição da sociedade. Então quando falamos de experiência do usuário o que devemos lembrar é que ela começa bem antes da compra, lá com a equipe de marketing, e essa expectativa vai ser então atendida, superada ou frustrada na compra e uso do produto ou serviço.

Nós mesmos criamos algum tipo de experiência antecipada, pela forma como nos vestimos, pelos comentários de outras pessoas de nós, pelo portfólio, postagens em redes sociais, entre outras coisas. E nós temos controle de apenas uma parte dessa experiência, todo o resto é criado sem nem percebermos ao nosso redor.

É por isso que muitas vezes nós mesmos, produtos, marcas ou serviços têm dificuldade em saber que tipo de experiência estamos criando para os nossos clientes, e é por isso que a pesquisa de experiência do usuário (UX Research) está crescendo muito nos dias de hoje.

Experiência momentânea

A experiência momentânea acontece no exato momento em que estamos usando um produto ou serviço. Ela é o tipo de experiência mais discutido no campo do design, com várias recomendações e boas práticas conhecidas.

Ela é importante principalmente porque vai guiar as experiência anteriores. Sabe aquela frase que diz “a primeira impressão é a que fica”? Essa primeira impressão é a experiência momentânea.

Um dos elementos mais importantes (senão o mais importante) nesse tipo de experiência é a usabilidade, ou seja, a facilidade de uso do produto ou serviço. Por isso, o designer que queira entrar nessa área tem que conhecer muito sobre usabilidade, sem esquecer que ela não é o único elemento da experiência.

Por mais fácil que seja de usar um produto ou serviço, se a expectativa criada na experiência antecipada não se concretizar, a experiência será ruim ou no mínimo menos positiva do que foi projetado ou proposto.

Obviamente a estética nesse momento é fundamental, mas não vou entrar agora nesse assunto porque ele merece uma discussão específica. Mas para adiantar, a estética influencia muito na usabilidade de um produto.

Exemplos de telas de onboarding de Mahesh Shanbhag

Outro fator relevante nesse primeiro contato são as estratégias de integração (onboarding) dos clientes. Como é a primeira vez que ele está usando o produto ou entrando em contato com o serviço é importante ser gentil e ir mostrando para ele o que e como ele pode realizar as principais tarefas.

Experiência episódica

Depois, dependendo do que aconteceu no primeiro uso uma parte das pessoas vai voltar a usar o produto/serviço, esse novo uso é chamado de experiência eposódica. Então ao longo do tempo vamos ter vários episódios em que as pessoas vão voltar a usar o produto ou serviço reforçando ou mudando a sua percepção sobre ele.

Depois de um certo número de episódios as pessoas vão se tornando mais experientes no uso do produto, e daí é importante começar a dar a elas mais controle e praticidade, criando atalhos para as ações que ela mais usa, informações adicionais e insights relevantes sobre as ações que ela está fazendo, dando sugestões de outros produtos ou serviços que ela pode achar relevantes.

As recomendações na interface da Netflix são um caso clássico de uso de recomendações em experiências episódicas

Um caso clássico nesse sentido são as recomendações da Netflix baseadas nas preferências dos usuários, onde são sugeridos novos conteúdos com base nas avaliações anteriores dos usuários. Nesse caso, a sugestão dos novos conteúdos é baseada nas outras experiências episódicas dos usuários, criando um sistema que oferece algo muito relevante para o usuário, já que possivelmente eu vou querer ver outros filmes ou séries que tenham a ver com outros que eu gostei.

Exemplos de insights no Google Analytics

Outro exemplo mais técnico são os insights do Google Analytics, uma ferramenta do Google para acompanhamento do uso de websites e aplicativos. O sistema avisa automaticamente a respeito de comportamentos relevantes de uso, como picos de visitas ao site, de tempo de permanência, entre outras informações. Isso ajuda muito usuários que precisam acompanhar grandes websites ou aplicativos muito populares, porque esse tipo de análise seria muito mais difícil de fazer, ou mesmo nem seria feita.

Experiência cumulativa

A experiência cumulativa é a soma de todas as experiências que uma pessoa/usuário teve com o produto ou serviço. Ela pode ser considerada um “conjunto da obra” uma “média” em relação a todas as experiências.

Como a experiência do usuário é afetada pelo contexto de uso, as experiências que temos não são todas iguais, algumas serão melhores, quando “tudo deu certo” e outras nem tanto, como quando não conseguimos realizar alguma tarefa ou ela aconteceu a trancos e barrancos.

Então se a soma de todas as experiências episódicas foi em média positiva nós vamos tender uma experiência cumulativa positiva. De outro lado se a média das experiências não foi tão boa nós temos a tendência a avaliar o produto ou serviço como “médio” ou “ruim” mesmo que em alguns casos eu tenha tido uma boa experiência com ele.

Outro fator que influencia a experiência cumulativa é a imagem da marca, do produto ou do serviço. Mesmo que eu tenha tido boas experiências e o produto em si seja avaliado como excelente, se a sua imagem for afetada eu passo a ter um efeito negativo na experiência cumulativa.

A imagem da marca tem um grande efeito na experiência do usuário

Um exemplo foi uma promoção de faxina por R$ 19,90 feita por um aplicativo de serviços domésticos. Nesse caso para os usuários a promoção pode parecer fantástica, mas a mobilização feita em relação a ele nas mídias sociais pode ter feito com que os usuários do aplicativo passassem a vê-lo como um sistema que explora as empregadas domésticas.

Nesse caso por mais que as experiências episódicas tenham todas sido positivos até o momento do anúncio, a imagem da marca que é um elemento que não tem a ver com o uso influenciou a experiência negativamente.

Resumindo

O uso de um produto ou serviço é apenas a ponta do iceberg quando se fala de experiência do usuário. Uma grande gama de fatores externos e internos ao produto ou serviço podem influenciar e por isso é sempre importante lembrar que a experiência do usuário não está na interface do app, do website, do jogo, ou de qualquer produto ou serviço, mas sim no conjunto da obra que se entrega às pessoas, não só as pessoas individualmente, mas à sociedade como um todo.

           
sobre o autor Davi Denardi Davi Denardi é pesquisador de design editorial e game design, e professor dos cursos de Design Gráfico, Design Digital e Design de Jogos da Universidade Federal de Pelotas.

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